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Edson Grandisoli

A sustentabilidade do sentir

A questão socioambiental, se bem trabalhada, responsabiliza.

 

Se mal trabalhada, culpa e imobiliza.

 

Estas simples constatações surgiram por dois caminhos diferentes nessas últimas semanas por meio de experiências com alunos de ensino médio. Um deles, ligado à minha atuação como professor na área de educação e sustentabilidade, e outro como mediador de um debate sobre o filme Trashed na Biblioteca Villa-Lobos, dentro da mostra Ecofalante de Cinema Ambiental.

 

Em ambas as ocasiões, as opiniões de diferentes estudantes sobre os muitos desafios de ordem socioambiental refletem impotência e falta de esperança com o futuro, o que os faz duvidar da humanidade e deles mesmos enquanto agentes de transformação.

Essa realidade transparece com frequência em discursos que “atribuem culpa”, ou seja, que transferem a responsabilidade dos muitos desafios para uma entidade externa e/ou, em alguns casos, apelam para a norma social percebida no estilo “se ninguém faz, por que eu tenho que fazer?”

 

O discurso socioambiental de cunho preservacionista não é novidade na escola, em seu currículo e materiais didáticos. O discurso vazio de “salvar o planeta” ainda é recorrente e está provado que não mobiliza. De modo geral, as questões socioambientais na escola são tratadas com o foco no problema, e tratam algumas soluções como apêndices, fazendo-os, muitas vezes, parecer grandes e distantes demais da realidade da maioria da população.

 

Nesse formato, o discurso educacional se torna desinteressante, pois não estabelece significação. Sendo assim, o resultado é a desmobilização e a imobilização.

 

Além do foco no problema, a abordagem cognitivo-informacional prevalece. Os estudantes têm que saber como os gases estufa ajudam a aquecer o planeta, como os CFCs agridem a camada de ozônio, por que o desmatamento da Amazônia afeta as chuvas no Sul e Sudeste, etc. Todas essas informações são vitais para a compreensão dos processos, mas não devem constituir a linha de chegada em termos de aprendizagem e estímulo a novos comportamentos.

 

Talvez algumas perguntas mais essenciais estejam faltando, a fim de criar um modelo de aprendizagem mais complexo, dinâmico e que envolva de verdade o estudante: Por que só me sinto feliz ao adquirir algo novo? Quanto tempo dura essa felicidade até que eu precise de algo mais? Por que quero tanto um carro ao fazer 18 anos? Como as mídias afetam meu comportamento? Em resumo, como eu me SINTO frente ao mundo, aos outros e a mim mesmo?

 

Sentir tem tudo a ver com sustentabilidade.

 

Em conversa com os estudantes durante os eventos que citei, fizemos juntos um exercício que pensou no que está fora, mas olhou para o que está por dentro. No final, fomos capazes de identificar sentimentos que estão (ou podem estar) por trás de muitos comportamentos como inveja, medo, insegurança e ganância. Esses sentimentos alimentam nosso desejo e também os padrões insustentáveis de consumo e desigualdade.

 

Como delinear uma sociedade mais sustentável do ponto de vista educativo se são esses sentimentos que nos movem? Como substituir competição por cooperação e solidariedade? Como pensar em coletividade e alteridade em um mundo que enaltece o individual? Por que falar em sentimentos está tão distante da realidade escolar?

 

Abordar na escola aspectos cognitivos e afetivos de maneira combinada certamente colaborará na formação de pessoas mais íntegras, integrais e interligadas, passo fundamental para uma sociedade mais sustentável dentro de suas mais diferentes facetas.

 

 

Texto original publicado no Portal do Educador, em 8 de junho de 2015.

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