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  • Edson Grandisoli

Educação Climática: breve guia de ação e engajamento

Texto por Edson Grandisoli, Diretor Educacional do movimento Escolas pelo Clima



A mudança climática é um problema global, complexo e sistêmico. Ela não respeita fronteiras, e suas consequências afetam de diferentes maneiras os ambientes, os seres vivos e a humanidade. O Banco Mundial estima que mais de 200 milhões de pessoas terão que se deslocar buscando melhores qualidades ambientais e de vida até 2050. Essas migrações em massa, os refugiados climáticos, são uma nova forma de crise humanitária que o mundo terá que lidar, o que pode também desencadear novos conflitos geopolíticos.


Esse é apenas um exemplo da cascata de eventos sociais que já está acontecendo, e conhecer essa realidade, posicionar-se política e criticamente, bem como colaborar na busca por soluções deve ser papel de todo o cidadão dentro de suas possibilidades e considerando uma perspectiva, ao mesmo tempo, globalizada e mais solidária. Acredito que um dos principais caminhos para construir novas visões e concepções de presente e futuro esteja diretamente relacionado a um movimento ainda incipiente denominado educação climática.


Dentro dessa visão holística, de uma crise que não respeita fronteiras e culturas, emerge a importância do novo tripé da sustentabilidade baseado nos pilares da participação, colaboração e corresponsabilização. Ou seja, a busca por soluções para esse desafio global passa, em diferentes instâncias, escalas e intensidades, a ser responsabilidade de todos e todas e, dessa forma, sentir-se responsável, bem como colaborar e participar como parte da solução parecem ações cada vez mais importantes.


Ainda não existe exatamente uma definição para o que é, e como desenvolver a educação climática. E talvez nunca exista pela multiplicidade de realidades. De forma geral, entretanto, educar para o clima visa garantir que as pessoas recebam informações científicas de qualidade que colaborem com o desenvolvimento de valores, atitudes, competências e comportamentos que colaborem no enfrentamento da crise global climática.


Apesar de poder soar como uma ação individual, nunca estivemos à frente de um desafio que exige posicionamento político assertivo, porque antes de ser um problema ambiental, a mudança climática é um problema social, político e diplomático. Basta acompanhar de perto as muitas COPs já realizadas para compreender a importância das dimensões políticas nacional e internacional.





Vale destacar que, para além do desafio já ser grande o suficiente causando, muitas vezes, paralisia, ansiedade, desesperança e conformismo, existem outros fatores que dificultam ainda mais a tarefa de colocar em prática ações climáticas efetivas. Grupos que negam a contribuição da Ciência, em especial aqueles que ainda negam a responsabilidade humana na crise climática, criam comunicações tão persuasivas quanto enganosas, colocando em cheque a possibilidade de caminharmos de forma mais acelerada na busca por soluções.


O Fórum Econômico Mundial, por meio do relatório Riscos Globais 2024, pela primeira vez na história, elegeu a desinformação (disinformation and misinformation) como o principal risco global para os próximos 2 anos. Isso reforça a tese da importância da Ciência e de como comunicá-la da melhor forma possível, o que costuma não ser tarefa simples para boa parte da comunidade científica, ainda muito habituada a dialogar por meio de linguagem pouco acessível e restrita a seus pares.


Na mesma direção, mas de maneiras distintas, as diferentes formas de comunicar a crise climática para os jovens em idade escolar também precisam ser rapidamente repensadas, lapidadas e amplificadas. A ansiedade climática (ou ansiedade ambiental) já é uma realidade entre os jovens, e também entre muitos adultos incluindo educadores e educadoras. A abordagem catastrófica, que culpabiliza as pessoas pelos males do mundo, e pouco propositivas, não deveriam ter lugar em uma boa comunicação climática. Isso não significa que devemos “poupar” os jovens da realidade e da dimensão da crise que estamos vivendo. Devemos, sim, buscar abordagens mais inovadoras, criativas e que despertem o desejo de agir, hoje, em parceria com a comunidade escolar e familiares.


Sabemos que essa não é uma tarefa simples, mas ela é urgente e deve chegar aos jovens por meio de estratégias considerando-se as educações formal, não formal e informal. Pode parecer pouco, mas segundo o Censo Escolar (2021), estamos falando de um universo de mais de 40 milhões de jovens matriculados na Educação Básica pública. Além disso, é fundamental formar educadores dentro de uma nova perspectiva para o enfrentamento da mudança climática. O mesmo censo fala em mais de 2,5 milhões de educadores nas redes públicas brasileiras. Um universo representativo como este, e com grande poder de mobilização e transformação, não pode ser ignorado.





Pensando nisso, gostaria de compartilhar 5 pontos importantes para educadores que desejam trabalhar com educação climática.



1. Ouça antes


Existe uma tendência quase irresistível, em particular para professores especialistas, em apresentar gráficos, dados, imagens, relatórios, depoimentos, vídeos, etc. Esse, entretanto, tem se mostrado um caminho pouco interessante e mobilizador, além de poder acentuar ainda mais sentimentos como medo e impotência. O que seus estudantes sabem sobre a mudança climática? Em que acreditam? Como se sentem em relação a esse desafio? Essas são apenas algumas questões que podem guiar um bom início de conversa. Realizar esse levantamento dos conhecimentos e olhares prévios dos estudantes certamente trará dicas de caminhos possíveis de trabalho coletivo, bem como garantir a abertura de canais de diálogo sobre a temática de maior qualidade. Parta de conhecimentos, olhares e percepções preexistentes para criar novos conhecimentos significativos.


 

2. De olho no contexto


Não existe fórmula pronta para o enfrentamento da crise climática via educação. Cada ação depende do que é relevante – e talvez urgente - para a escola e comunidade neste momento. Estimule um olhar crítico e investigativo entre os estudantes. Realize pesquisas, organize rodas de diálogo, crie canais digitais de comunicação com a comunidade. Toda percepção é importante, e criar ações com base nos desejos da comunidade colabora com o engajamento e senso de pertencimento. Importante ressaltar que o foco no contexto não elimina a possibilidade de aprofundamento teórico-conceitual e prático. Ou seja, estabelecer conexões com a realidade próxima garante sentido e gera proatividade.



3. Foque nas soluções


Compreender o desafio climático é fundamental. Entretanto, é fundamental também compreender que existem soluções viáveis e ao alcance da comunidade escolar para o enfrentamento da crise climática. Ou seja, não é preciso “reinventar a roda” para agir a favor do clima na escola. Hortas agroecológicas, plantio de mudas, gestão de resíduos, água e energia são apenas alguns caminhos que dialogam diretamente com a perspectiva de uma educação climática. O foco no problema, o catastrofismo, gera imobilismo e indiferença.



4. Defina um objetivo


Onde estamos agora e onde queremos estar ao final deste ano com relação à ação climática que queremos desenvolver? Defina um objetivo claro e possível. Trabalhar com uma perspectiva de curto ou médio prazo colabora com a definição de um objetivo alcançável. Pequenos passos e pequenas (ou grandes) vitórias encorajam a todos, aumentando a corresponsabilização e o desejo de fazer mais. Seja prático, realista e assertivo.



5. Busque parcerias


Nem sempre os educadores e as escolas dão conta de todas as variáveis, em especial sobre um assunto tão amplo e complexo como a mudança climática. Ninguém sabe tudo e, nesse caso, parece cada vez mais importante considerar as parcerias externas à escola como postos-chave para o sucesso das ações climáticas. Entre em contato com especialistas, busque apoio no trabalho de diferentes instituições de pesquisa e seus respectivos pesquisadores. Associe-se a movimentos e grupos que têm como objetivo colaborar na formação dos educadores e dos estudantes, fomentando ação climática, como é o caso do Movimento Escola pelo Clima. Não existem soluções para problemas complexos e sistêmicos sem interdisciplinaridade e colaboração.



Esses são apenas 5 pontos que acredito que podem colaborar com o início de um processo de educação e ação climática na sua escola de forma mais estruturada, visando garantir sua permanência e continuidade no espaço escolar.


Nos próximos textos, vamos explorar um pouco mais sobre as muitas possibilidades de trabalho considerando-se diferentes etapas de ensino.


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